Mais famoso escritor brasileiro de origem indígena, Daniel Munduruku preserva a sua cultura em dezenas de livros, a maioria deles adotada no ensino fundamental
Maíra Magro
Encantada com as histórias indígenas contadas pelo professor de filosofia, uma aluna perguntou: "Onde eu encontro essas informações?" O mestre, desconcertado, não soube o que responder. Elas não estavam escritas em lugar nenhum. Foi assim, há mais de uma década, que Daniel Munduruku, índio criado na aldeia Maracanã, no interior do Pará, decidiu transportar as lendas e tradições de seu povo para o papel.
Hoje, aos 45 anos, é considerado o principal representante de um gênero ainda em formação no Brasil: a literatura escrita pelos povos indígenas. Sua primeira obra, "Histórias de Índio" (Companhia das Letrinhas), de 1996, vendeu mais de 60 mil cópias e está na 16a edição. A segunda, uma enciclopédia com verbetes nativos, ganhou o Prêmio Jabuti. Ao todo, Munduruku publicou 31 livros, a maioria voltada para o público infanto-juvenil - e lança outros dois na Feira Indígena de Mato Grosso, que acontece de 6 a 10 de outubro, em Cuiabá.
As obras ganharam destaque nas livrarias e são adotadas por escolas em todo o País. "Ele é uma figura absolutamente original dentro da literatura brasileira", diz o escritor Moacyr Scliar. A temática de Munduruku não envolve apenas a tradição indígena e seus valores, mas também o respeito à natureza e à vida em comunidade.
É atual porque trata dos dilemas da civilização, questões que enfrentou desde criança - começando pelo seu nome de branco, Daniel Monteiro Costa (mais tarde, adotou a denominação de seu povo como sobrenome artístico). Na aldeia, a língua nativa era proibida durante as aulas com os missionários católicos.
"Uma violência tremenda, que nos fazia sentir excluídos", diz. No livro "Meu Avô Apolinário", premiado pela Unesco, ele conta como os ensinamentos do avô paterno o ajudaram a valorizar sua identidade. Em outros, trata de mitos, brincadeiras infantis e também de amor. Na juventude Munduruku recorreu à Igreja para concretizar o sonho de ser professor.
Passou seis anos no seminário, onde se formou em filosofia, com especialização em história e psicologia: "Foi uma jogada inconsciente para continuar estudando." Hoje é ativista pelos direitos indígenas, tem um blog e faz doutorado em educação. Casado e pai de três filhos, ele não se preocupa em passar só para eles a tradição oral de sua cultura. Quer vê-la viva também nas escolas e no papel.
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